Sábado, Abril 27, 2024
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Nação Valente: O apocalipse português

Na semana de comemoração do resgate da liberdade em Portugal, chega às nossas salas Nação Valente, a segunda longa metragem de Carlos Conceição. Por aqui se encena uma consistente e muito atual parábola sobre o vazio da guerra, a soberba imperial, ao mesmo tempo que se acenam os perigos e a vigilância do antigo regime, pelos sinais do recrudescimento da extrema direita. Razão pela qual, o cineasta de 42 anos refere na nossa entrevista que este é mais “um filme sobre a actualidade do que o passado”.

O cenário é Angola, em 1974, um ano antes da independência. Sente-se no ar a pressão descolonialista, a guerrilha à espreita e, claro, a incompreensão de uma guerra dos outros. Algo que não esmorece um grupo de soldados portugueses (representados pelo repetente e irrepreensível João Arrais, além de Miguel Amorim, Ivo Arroja, Vicente Gil, Diogo Nobre, André Cabral ou Sílvio Vieira) diante o estado de alerta permanente alimentado pela presença imperial da figura expressionista do coronel (Gustavo Sumpta).

O olhar puro de Ulé Baldé, em Nação Valente (Foto: Terratreme)

Apesar do ambiente hostil, emerge um momento de amor entre uma jovem (Ulé Baldé) e um militar (Silvio Vieira), impulsionado por uma candura que nos recorda as pausas entre o conflito, na linha de Terrence Malick, em A Barreira Invisível (1998). Mas é também o caos que põe em fuga a freira missionária (Leonor Silveira, num breve, mas inesquecível momento). Há ainda Anabela Moreira, a mulher ‘experiente’ que ajuda este grupo a encontrar a saída do muro em que se encontravam.

É neste huit clos, dominado pela pressão psicológica, obediência cega ao credo autoritário e permanente dedo no gatilho da G3 que esta ‘nação valente’ se revê nos princípios de um estado a cair de velho. Algo que é sublinhado pela iluminação noturna e o trabalho de fotografia de Vasco Viana, colaborador habitual de Conceição, possibilitando este acordar dos fantasmas do passado.

Nação Valente é assim um rigoroso gesto de cinema, sem receio de ceder ao género, embora apostado em deixar a marca da parábola entre a memória e um colonialismo impregnado de zombies. É o tal muro de que nos fala Carlos Conceição na nossa entrevista.

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