Terça-feira, Março 19, 2024
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Era uma vez em Cannes: Quentin Tarantino não está nada ‘out of time’

E cria um clássico instantâneo com ‘Era Uma Vez em Hollywood’ é a melhor ‘exploitation’

Era uma vez um miúdo que via cinema de forma descordenada, vivia nas salas de cinema, nos clubes de vídeo, saltitando de género, nas sessões contínuas. O cinema na sua forma mais popular. Esse puto deu-nos agora aquele filme em que parece resumir tudo, toda a história, todas as histórias, todas as músicas. Toda a nostalgia. Pena é que em Portugal teremos de esperar até do dia 8 de agosto para ver ‘Era uma Vez em Hollywood’! O tal penúltimo filme de Quentin  Tarantino.

Yes, Quentin Tarantino did it again! Ao longo das 2h39 minutos – sim não se perde nem um segundo – leva-nos a uma sensacional viagem através do cinema, do efeito hipnótico da televisão nos anos 50, ao western spaghetti, à própria mitologia do cinema. Um filme potente, cheio de energia, cheio de cinefilia, cheio de música – sempre que se abre a porta de um carro, surge a oportunidade para fazer essa descrição sonora em mais uma banda sonora que promete.

Já se sabe, já vimos todos o trailer. Brad Pitt é Cliff Booth, o duplo de serviço de Leonardo DiCaprio, Rick Dalton, uma estrela do western televisivo. Um é disciplinado e vigoroso para que o outro possa ser alcoólico e inseguro. É nos anos 50 que começamos, em plena euforia da televisão, numa altura em que o cinema tem também a sua quebra maior e que procura todas as fórmulas para se reinventar. Do grande ecrã, para combater com o pequeno, os efeitos visuais. E vamos para o presente, 1969. E o que temos? Um Cliff um bocadinho ‘out of time’. É o western que se reinventa com as possibilidades que chegam da Europa, em Itália e em Espanha, o western Spaghetti ou o ‘dirty cinema’, vulgo cinema porno, que dava também os primeiro passos.

Acompanhamos assim o trabalho em Hollywood destes dois amigos. Rick é mais do que o duplo, é uma espécie consciência boa. Mas Cliff também se supera quando está a representar, pois é na ficção, na sua meta-vida, que gosta de viver. E até esquece a sua ligeira gaguez. Acabará por tentar sobreviver ao tempo procurando em Itália a alternativa do cinema ‘esparguete’ à televisão já ‘out of time’ no final dos anos 60.

Como se imagina, Tarantino gosta do lado de época e aborda precisamente esse período – será que alguma vez daí saiu? – para nos fazer viver o lado meta do cinema. Há Playboy Mansion, há figuras reais como Sharon Tate (Margot Robbie) a atravessar todo o filme, Roman Polanski (o polaco Rafal Zawierucha), Steve McQueen (Damian Lewis), Bruce Lee (Mike Moh), numa cena hilariante com Rick (Brad), enfim, a mitologia que desenvolve uma história própria mas que não valerá a pena revelar ‘spoilers’.

Tal como nor filmes anteriores, Quentin vai baú e sumerge-se em referências e detalhes de referência nostálgica, mas que acabam por acrescentar algo ao DNA do próprio cinema. Por isso, teremos de dizer que este Era uma Vez em Hollywood é também um pouco esse olhar para a história do cinema, mas que lhe acrescenta algo de novo. Isso acontece, por exemplo, quando Tarantino dá nova cor aos temas musicais fazendo-os contas novas histórias com uma letra antiga. Como sucede no tema clássico dos Rolling Stones Out Of Time quando os dois regressm de Itália. É difícil não ficar arrepiado: You don’t know what’s going on, You’ve been away for far too long, You’re out of touch, my baby, I said, baby, baby, baby, you’re out of time.

É claro que nesta altura se torna desnecessário falar em previsões de prémios, embora se torna também claro que Quentin Tarantino deixou aqui um dos trabalhos em que vai mais fundo na sua conceção de um cinema ancorado no jogo de géneros, na revisão do passado mas que não deixa de inspirar o cinema mais jovem. E satisfazer a nossa cinefilia.

Espera, então temos um filme do Tarantino sem sangue? Calma: imagine-se então o resultado quando se junta uma seita, um cigarro embebido em LSD, um lança-chamas e uma cadela pit bull.

Era uma vez…

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