Quinta-feira, Março 28, 2024
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Feliz Dia Para Morrer: o outro feitiço do tempo

Hoje é o último dia do resto da tua vidaı, lembram-se? Claro, mas Sérgio Godinho não é para aqui chamado, ainda que tal máxima sirva de apanágio a este simpático e assustador filme de terror. Simpático, porque não se pretende levar a sério, assustador porque assume a premissa do género slasher movie, na linha de Gritos, Pesadelo em Elm Street ou outras franchises. É um grande filme? Nem é isso que está em causa. Diverte-nos qb e goza com os rituais adolescentes, com os géneros e as influências do meio. Assumidamente pipoqueiro, mas mesmo assim nada indigesto.

Toca o telefone, a anunciar que do aniversário de Tree (a loira Jessica Rothe, alguém se lembra dela em La La Land?); ressacada percebe que dormiu num dormitório de rapazes e que nem se lembra do nome do tipo que tem diante de si. O embaraçado Carter (Israel Broussard) diz que nada aconteceu, mas antes de se dirigir à sua república e juntar-se às coleguinhas muito bitchy, Tree vai-se cruzando com algumas figuras que parecem prolongar o seu pesadelo/ressaca. Até que, já à noite, preparada para ir jantar com o pai, acaba por ser morta por um tipo com uma máscara de bebé, a mascote da equipa de futebol local. Logo a seguir, toca o telefone a anunciar o aniversário dela. Percebem? É o déjà vù circular, em que tudo se passa da mesma forma. Bom com pequenos elementos, aqui e ali, que se alteram, de modo a que a moçoila passe a tentar perceber como poderá sair daquele pesadelo interminável e saber quem a quererá matar.

Sim, não é preciso pensar duas vezes para perceber que temos aqui um clone de O Feitiço do Tempo, de Harold Ramis, o tal clássico de 1993 que celebrizou para sempre um Bill Murray que acordava sempre no mesmo dia, o Dia da Marmota. É claro que com as variantes de cada novo dia de Tree, percebemos que se trata de um filme movido pelo guião, um filme de guionista. Mas aqui é que também a porca torce o rabo, porque o realizador Christopher Landon até é mais conhecido como guionista do que propriamente como cineasta. Por exemplo, assinou as várias sequelas da saga Atividade Paranormal, para além do muito interessante Paranóia, de D.J. Caruso, com Shia Lebeaouf e co-assinou o mais recente Viral, de Henry Jost e Ariel Schulman. Mas, vá-se lá perceber porquê, neste filme o tratamento ficou a cargo de Scott Lobdell, um rapaz sem uma experiência relevante.

O que não se percebe bem é porque essa informação sobre O Feitiço do Tempo foi relegada para o final do filme e não tratada logo como elemento de partilha interno, já que se trata de um filme tão conhecido. Embora no filme Tree admita que não conhece o filme, nem Bill Murray. Mas isso é um gag. Ayé porque assume claramente o cliché da loira mais interessada nas borgas patrocinadas pela sua irmandade do que por este tipo de conhecimento mais ou menos cinéfilo. Mesmo sem ter uma interpretação muito exigente, Jessica Rothe devolve uma prestação com suficiente à vontade e graça. Curioso é que esta sucessão de tentativas de não morrer e acordar para o mesmo dia acaba por se embrenhar num whodunnit, em que Tree e Carter tentam perceber como deslindar este imbróglio de morte e renascimento.

Ainda assim, e apesar do que já foi dito, Feliz Dias Para Morrer não paga o seu tributo com sangue, apesar das sucessivas mortes que Tree tem de superar. Mesmo que seja por uma proteção de classificação etária, facilitando o filme para os maiores de 12 anos, não nos parece que o lado puramente slasher contribuísse com matéria prima suficiente para espevitar a curiosidade. Por sinal, ao contrário até do recente It, que navega no dilema do filme de horror adulto, embora com personagens pré-adolescentes, saúda-se aqui o lado mais comédia desta vertente e assim mesmo mais perto de O Feitiço do Tempo.

Lá está, Feliz Dia Para Morrer convive bem com as suas limitações e não parece desejar mais do que fazer humor com estes adolescentes muito hip, muito bitch e muito low carb, e com caloirada à mistura. Nesse sentido, o filme até funciona numa dinâmica videogame, em que temos de tentar não morrer nesse dia. Um pouco ao reverso das missões de Hitman

Sim, Feliz Dia Para Morrer não inventa nada de novo. Assume até o plágio a O Feitiço do Tempo. Pena é que não use esse conhecimento para uma paródia maior e opte antes por um vulgar whodunnit. Ideal para uma sessão com a namorada para emborcar pipoca e bebida açucarada. É que não haverá problemas de indigestão final.

 

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