Terça-feira, Abril 23, 2024
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Alice nas Cidades: on the road again

É um Wenders revolucionário que redescobre em 1974 o poder da paisagem americana para o filme Alice nas Cidades, recriando assim a polaroid para o que será, dez anos mais tarde, Paris, Texas. Pelo caminho, foca e apura a atenção num cinema errante, de descoberta em movimento, de panorâmicas feito road movie. Mas também da música, da fotografia, da literatura e das cidades. No fundo, o jogo dos elementos que impregnaram o seu cinema. Por isso mesmo, rever ou descobrir este filme é apalpar tudo aquilo que aprendemos a gostar em Wim Wenders.

Mesmo que essa não fosse a sua descoberta inicial, já que na sua curta 3 American LPs, de 1969, esses elementos já estavam presentes – seria preciso rodar filmes sobre a América apenas com panorâmicas. Mas na música isso já existe – dirá Wenders em off, a propósito dessa deriva entre paisagens americanas e alemãs com a banda sonora de discos de Van Morrison, Creedence Clearwater Revival e Harvey Mandel.

E desta curta apetece-nos até fazer o raccord musical na sequência mágica de Alice, em que Rudiger Vogler e a inesquecível Yella Rottlander escutam On the Road Again, dos Canned Heat, na jukebox, com um miúdo languidamente a lamber um gelado e trautear a música. Esta é a história do escritor e fotógrafo Philip Winter (Vogler) demasiado inspirado com a paisagem local para não enxergar que vive a sua própria história. Esta foto precisa de tempo. Vais ver como a imagem aparece e fica magnífica, explica Philip à Alice (Yella) o processo de revelação automático da imagem.

Mesmo sem a parceria narrativa de Peter Handke (mas com quem já colaborara, precisamente, em 3 Amerian LPs) acaba por estar omnipresente nesta deriva que se irá prolongar pela Alemanha. É essa composição de polaroids que vamos seguindo, devidamente trabalhada pelo notável trabalho a preto de branco da câmara de Robby Muller, em 16mm, bem como pela dádiva de Yella (que apenas tinha como experiência a participação em Letra Escarlate, o filme anterior de Wenders), ela que apenas fimou com Wenders (participaria ainda em Tão Longe, Tão Perto, em 1993) e que persiste como um mistério ou uma polaroid que não se revelou completamente.

É claro que teríamos pouco depois, Movimento em Falso, um ano depois, e Ao Correr do Tempo, em 1976, a completar a trilogia on the road de Wenders. E, claro, Paris, Texas, a prolongar aquele que será o melhor momento do cinema de Wenders. Ao qual se inclui, naturalmente, As Asas do Desejo, já em 1987. É o cinema e as imagens de Wim Wenders que importa fixar.

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