Sexta-feira, Abril 19, 2024
InícioCríticasUncategorizedO cinema e a política: 'Comportem-se como Adultos' e 'Enquanto a Guerra...

O cinema e a política: ‘Comportem-se como Adultos’ e ‘Enquanto a Guerra Durar’

O cinema de veia política é cada vez mais necessário nos dias de hoje, mesmo quando é a própria política a assumir por vezes nuances de inesperado espetáculo. Por Paulo Portugal.

Não deixa de ser curioso que esta semana estreiem dois filmes com essa marca: Comportem-se como Adultos, do cineasta veterano franco-grego Costa-Gavras, e Enquanto Dure a Guerra, do espanhol Alejandro Amenábar. A outra curiosidade é que os vimos, precisamente no mesmo dia, o mês passado durante o festival em San Sebastian.

Mesmo com 87 anos, percebe-se que Costa-Gavras não perdeu o olhar acutilante em redor do fenómeno político. Uma análise bastante feliz no registo sobre o resgate financeiro da Grécia em 2015, depois das eleições ganhas pelo Syriza, em particular essa desgastante negociação com o Eurogrupo para a aprovação e assinatura do MOU, o “memorando de entendimento”. O filme é adaptado a partir do livro do ministro das Finanças na altura, Yanis Varoufakis, reproduzido com surpreendente eficácia no mimetismo perfeito de Christos Loulis.

Gavras encena com algum virtuosismo esse momento histórico da política grega (e europeia, de resto tão próxima da realidade portuguesa da altura). Ao encenar as reuniões do ministro que se recusava a usar gravata em que tentava convencer uma plateia sisuda da necessidade de compreender a profunda crise grega, Gavras está ao mesmo tempo a devolver algum realismo a um bastidor normalmente impermeável. Aliás, segundo nos revela Gavras na nossa entrevista, nessas reuniões não era possível tomar notas, razão pela qual alguns (como Varoufakis) decidiram gravar as reuniões em áudio. Foi precisamente esse material que lhe serviu de barro para edificar este thriller político com tons de tragédia grega.

Enquanto a Guerra Durar

Enquanto a Guerra Durar

Enquanto a Guerra Durar, de Alejandro Amenábar, debruça-se na recordação do apoio impreciso que o escritor espanhol Miguel de Unamuno (Karra Elejalde) deu ao golpe militar de 1936, destinado a derrubar o governo da Segunda república espanhola e que acabou por catapultar o general Franco ao poder após a Guerra Civil Espanhola.

Esclarece (ou aviva a memória) Aménabar no título que as razões mais ou menos pífias da escolha de um homem fraco que acabaria por se eternizar no poder. Isto apesar das motivações da escolha de Franco serem na altura limitadas apenas ao ‘período de guerra’, tal como redigido num documento oficial que seria entretanto rasurado, o que lhe permitiu manter o cargo de caudillo até à sua morte, em 1975.

Ensaia-se aqui o rasgo histórico e épico, mesmo sem nunca abandonar um certo academismo que acaba por afetar o filme. Ainda assim, fica a recordação do período da Segunda República, entre 1931 e 33 até à guerra civil, um momento que até hoje divide parte da população.

Seja como for, dois filmes vitais para a compreensão o estado de coisas da atual política europeia, que merecem ser vistos e debatidos.

RELATED ARTICLES

Mais populares