Sexta-feira, Março 29, 2024
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DocLisboa: Prazer, Camaradas! – Lembras-te quando fizemos uma revolução?

Há em José Filipe Costa a necessidade de devolver a memória das imagens, e o poder dessas imagens. Em Prazer Camaradas, um bravo documentário, produzido pela Uma Pedra no Sapato, de Filipa Reis e João Miller Guerra, presente na secção competitiva do DocLisboa, depois da sua exibição nos festivais de Locarno e Londres, procura-se a evocação e aproximação ao período pós-25 de Abril, em particular ao movimento da reforma agrária e à experiência das ocupações e criação de cooperativas, com toda a sua ingenuidade e vontade de mudança, sobretudo pela recriação dos próprios que encenam aquele  momento vivido há mais de 40 anos. De certa forma, um desenvolvimento que aprofunda o seu anterior filme, Linha Vermelha, vencedor do IndieLisboa em 2011.

Só que ao contrário de Linha Vermelha em que o passado é encarado de forma analítica a partir das imagens de arquivo, durante a ocupação da herdade Torre Bela (e que motivou o filme de Thomas Harlan Torre Bela, captando in loco essa ocupação em 1975), aqui volta-se ao mesmo ano para dar vida ao ambiente efervescente de criar uma cooperativa em terras ocupadas. E fazê-lo com a profundidade de procurar repetir esse momento, ao mesmo tempo que vai explorando os limites do documento enquanto auto-reflexão do próprio cinema. De certa forma, ensaiando a disponibilidade de usar e pensar a ideia de realidade e ficção num gesto que nos fez recordar o opção seguida por Pedro Pinho em Fábrica de Nada em 2017.

Curioso é que o ponto de vista é também aquele dos que tomaram conhecimento da Revolução fora do país e participaram na utopia de um país atrasado e de mentes tacanhas, abrindo espaço para encarar a paridade e a educação sexual, sobretudo tendo a vantagem da sua revisão e distanciamento. Ou ainda a própria impossibilidade da manutenção desse sonho pelo peso das convenções que abreviariam essa experiência. Fica ainda assim a memória do período em que a utopia foi possível, num registo que até poderia ser demasiado frágil, mas que acaba por ser revelar com uma pequena preciosidade.

 

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