Sexta-feira, Março 29, 2024
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La Mano Invisible: o reality show da precaridade

Mãos e corpos visíveis fundem-se num local de trabalho invisível e dão prova de vida da estreia do espanhol David Macián no formato de longa metragem. Ainda que a ‘mão invisível’ e o mecanismo autorregulador da economia de que falava Adam Smith, destinado a sublinhar a lógica natural do sistema neoliberal, acabem por ser invocados aqui para celebrar a evocação da precaridade.

Macián sugere o espaço aberto para dar corpo à adaptação do romance de Isaac Rosa, em que cada trabalhador ou ofício ocupa o seu espaço, um pouco à semelhança de Dogville, de Lars com Trier. Aqui se ensaia a narrativa do trabalho e se questiona o porquê dessa atividade. No entanto, é no fora de campo que a presença de um público omnipresente questiona cada acto, como se de um reality show se tratasse.

Aí, cada personagem cumpre diligentemente a sua estão função em jeito de performance. O pedreiro constrói um muro para de imediato o destruir com um maço, o talhante que prepara a carne, o mecânico separa as peças do automóvel, a operadora de telemarketing segue a lista de contactos, ou até o pacato informático com um objetivo secreto. Uma estreita divisão do trabalho, até que é introduzido no seu seio o elemento de ‘desordem’.

Em si, a ideia da esquematização da crise social não deixa de ser interessante e a motivar a devida reflexão. Se bem que acaba por esvair-se um pouco diante da inevitável proximidade com A Fábrica de Nada, de Pedro Pinho, vencedor do prémio FIPRESCI, em Cannes, na Quinzena dos Realizadores. Pela simples razão de que ambos os filmes partem de uma reflexão demasiado próxima, a crise económica, cada vez mais sentida como um sub-género cinematográfico em si próprio, ainda que sigam propostas diversas, optem, sobretudo, por propostas diversas e por uma linguagem de cinema própria, para chegar, necessariamente, a diferentes conclusões.

E é essa visão demasiado estereotipada, a celebrar o tal reality show teatral da precariedade, que acaba por não trazer nada de novo à equação do problema. Fica a solidez da ideia, com uma forma esquemática que não movimenta a emoção. Precisamente, o contrário do que sucede em A Fábrica de Nada. 

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