Sexta-feira, Abril 19, 2024
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Reportagem: No Complexo do Alemão com a equipa de ‘Complexo – Universo Paralelo’

Uma noite na favela

Aterrar no Rio com uma tremenda carga de ‘jet lag’ para, pouco depois, entrar de rompante pela perigosa favela Complexo do Alemão para assistir à exibição do documentário ‘Complexo: Universo Paralelo’, do português Mário Patrocínio, foi quase como fazer figuração para o filme que passará em breve no Doc Lisboa.

Quinze almas dentro de uma ‘van’, na companhia do realizador, dois jornalistas internacionais, a equipa da SIC e alguns amigos, incluindo o actor luso Ricardo Pereira, deixam para trás a primeira barreira de rua armadilhada pelos traficantes. Com a maior alma, Mário sai da carrinha e ergue da calha vertical o segmento de carril ferroviário que dá espaço para a carrinha passar. No fundo, uma imagem que viramos em ‘Tropa de Elite’ quando o ‘caveirão’ atacou a favela. A verdade é que a experiência de Mário nas favelas do Rio já inclui um cenário semelhante, pois também foi surpreendido pela maior operação de ‘limpeza’ do Estado, numa altura em que já captava imagens para o seu filme, e que acabou por as incorporar. Apenas os mínimos e a luz interior para revelar o interior do veículo, lá avançamos para o segundo ‘checkpoint’.

Quando o motorista decidiu parar, acabamos por avançar também a pé. Sempre seguindo Mário de perto, ficamos atónitos enquanto ele se dirigiu a uma ‘boca’ e cumprimentou o traficante rodeado de enormes sacos com centenas de embalagens da droga mais variada. “Ô portuga!”, disse abançando-o. Após uma breve troca de palavras e continuamos a subida. E quando passa por nós uma moto com o pendura armado com uma AK 47, Mário suspira: “Isto é que não era suposto veres”, como que a dizer que estava tudo programado para não haver exibição de armas. Afinal de contas era o dia da projecção do filme na comunidade. “Complexo do Alemão, o sonho virou realidade” grita o megafone preso num carro diante do salão improvisado – um campo de futebol tapado onde a família de D. Célia, entre outros habitantes se sentaram como puderam para assistir a esta incursão que Mário e o irmão Pedro para captar a vida e a alma da favela.

Mesmo com as deficientes condições de projecção e de som, deu para perceber como existe uma comunidade forte habituada a viver ao lado dos buracos de bala, dos infames ‘bailes funk’. Também o nosso grupo rapidamente se misturou com a comunidade. E já nem ligava ao trânsito infernal de motos tripuladas por adolescentes de ambos os sexos e até mesmo dos ‘caçadores’ de arma à tiracolo. No final, e de novo com o grupo a bordo, Pedro anuncia: “vou ficar, vou para o baile funk. Sou doido!” E lá seguiu. Até ao fim da noite. Será que foi tudo um sonho?

 

Paulo Portugal, no Rio de Janeiro

 

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